Cá estamos nós com mais um pouco de Laísa Couto, queridos leitores! Hoje temos o grand finale da série O Encontro, que vocês conheceram no finalzinho de julho. Mas podem ter certeza que muitas surpresas da nossa autora ainda estão por vir. Logo nós traremos uma nova saga aqui no Escolhendo Livros.
Se você ainda não leu a primeira parte, clique aqui.
O Encontro
por Laísa Couto
Eu funguei, mas não consegui evitar que uma lágrima teimosa caísse, levando outras tantas consigo.
- Não sei se posso... Se consigo –
digo eu, entre os soluços. - Parece tudo grande demais e que eu nunca
vou alcançar! - completei, revoltada comigo mesma.
- Não, não chore, menina! - disse
Zagut oferecendo-me um lenço. - As suas lágrimas são tesouros preciosos e não
deve desperdiçá-las dessa maneira. Lembra-se do que eu disse no começo? Nunca
achei que tivesse medo – repetiu o mago. - E continuo a ter essa certeza, sei que
não tem medo do inusitado, do surreal,
mas sinto que uma pontinha de receio ainda a assombra. Eu queria muito que meus
conhecimentos mágicos pudessem afugentar esse sentimento, mas fazer isso só
pioraria as coisas. Não quero lhe trazer uma falsa alegria... Não fui criado
pela sua imaginação para isso, você bem o sabe, minha cara. Bem o sabe.
Eu enxuguei meu rosto e percebi o
sorriso afável de Zagut. Aquilo me aquecera de forma misteriosa. Eu sorri de
volta, sem força, mas sorri. Lembrei de quando duas pequenas crianças
encontraram o mago pela primeira vez, elas morrendo de medo... Zagut conseguia
isso quando queria, porém eu sabia que a maldade não fazia parte da
personalidade dele. De repente, como se uma bola de neve tivesse caído sobre
minha cabeça e me despertado, dei um salto guardando o caderninho no bolso da
jaqueta jeans.
- Ai, já está tarde! Preciso ir,
Zagut!
- Ora, você não pode sair por aí agora!
- repreendeu Zagut levantando-se com auxílio do cajado. - A mata d'Os Vales
Adormecidos é perigosa durante o dia e ainda mais durante a noite! Não a deixarei padecer adormecida entre as
árvores sinistras desta velha floresta que nos rodeia. Até parece que se esqueceu dos perigos que sua imaginação fértil criou!" - terminou ele, rindo nervosamente.
Eu dei um sorriso amarelo.
- O que devo fazer, então? - perguntei.
- Pode passar a noite aqui. Amanhã
tomarei providências seguras para que amanheça em casa. - Ele foi até um
armário, que até então eu não tinha notado pois estava escondido atrás de
livros que se equilibravam fragilmente uns sobre os outros e trouxe-me uma coberta, já um tanto gasta e
mal cheirosa pelo desuso. Mesmo assim eu agradeci, pois o frio estava de
congelar. - Me desculpe, mas terá que passar a noite aqui na minha sala, ou
então os duendes fariam alarde pelas Três Torres sobre sua presença, o que seria
desagradável.
- Eu entendo, Zagut, não tem problema. –
eu disse, abrindo o cobertor e atirando-me na poltrona mais próxima da lareira.
- Eu não irei embora. Tenho coisas a fazer,
muito trabalho – e mirou a mesa cheia de pergaminhos. - Qualquer coisa, é só me
chamar. Tenha uma boa noite, querida. - despediu-se o mago.
- Obrigada. Você também, Zagut.”
Eu adormeci em instantes, um fato
inusitado para quem tinha noites insones, ou dormia na companhia de sonhos
desagradáveis. Eu esperei nunca ter que acordar, o sono estava
satisfatoriamente bom e ele não merecia ter fim. Mergulhei pelos mundos mais
distantes, empurrada por um fluxo constante de um torpor. Senti-me desvanecer
dentro de um vácuo, como se meu corpo sólido se tornasse tão fluídico a ponto
de se desmanchar, era uma sensação estranha essa, a alma ganhando liberdade por
uma noite.
Foi um momento breve e
longo, a urgência pedia passagem e a paciência a sufocava. Senti o desespero me
abater, não conseguia encontrar o caminho de volta. Procurei uma saída na
inexistência, o tempo estava acabando e se eu não conseguisse encontrar o
caminho certo ficaria perdida alí para sempre – entre os sonhos. Então, num
repente, um vácuo abriu sob meus pés e eu fui sugada por ele – sem ar, sem
vida, apenas escuridão, e um grito – o meu.
Acordei ofegante, a cabeça rodopiava e
quando finalmente parou, percebi que estava no meu quarto, na primeira manhã do
ano. Eu sabia disso porque continuava a chover lá fora. De súbito, toda uma alegria
misteriosa sumiu, deixando um vazio estranho. Meu olhar arrastou-se pelos
móveis, nada surpreso pela imagem familiar e comum da rotina. Então meu olhar
estacou sobre o criado-mudo. Haviam uns livros que eu estava
lendo pela segunda vez, uma caixinha de madeira, folhas de papel e um
caderninho. Prontamente o abri esperando sei lá o que, talvez os números da
mega-sena. No entanto, vi algumas palavras escritas aleatoriamente como “O
mistério tem vida própria”, “As notas melodiosas do seu coração”, “Vontade e
coragem”, “Agora não é mais pela dor"... Eu me perguntei quando eu havia anotado
aquelas coisas, então me lembrei de uma coisa, tomando-me de total excitação –
havia esquecido minha caneta em Lagoena!
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